sexta-feira, 7 de setembro de 2012

AMAZÔNIA

Uma janela para salvar várias espécies de extinção

Apesar de o desmatamento anual na Amazônia ter caído de 30.000 km2 para 6.000 km2 
nos últimos anos, muitas espécies ainda sofrem risco de extinção. (Foto: Reuters)
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No Dia da Amazônia, 5 de setembro, pode-se comemorar a redução das áreas desmatadas, mas o passivo do desmatamento ainda preocupa. Estudo publicado na revista Science mede o impacto da perda de habitat nas espécies nativas – mas mostra que ainda há tempo para reverter esse quadro.
O que acontece com as espécies que habitam áreas que são devastadas? Apesar da redução no ritmo do desmatamento na Amazônia – nos últimos dez anos, de 30.000 quilômetros quadrados para 6.000 quilômetros quadrados –, um artigo publicado em julho de 2012 na revista Science mostra que o desmatamento é uma bomba-relógio para os animais vertebrados que vivem nas áreas atingidas.

Conduzido por pesquisadores da Universidade Rockefeller, nos Estados Unidos, e do Imperial College, na Inglaterra, o artigo revela o “débito de extinção” da Amazônia, ou seja, uma estimativa de quantas espécies devem desaparecer da área em consequência do desmatamento, e em que período de tempo. O professor e pesquisador brasileiro Thiago Rangel, da Universidade Federal de Goiás (UFG), revisou o artigo e publicou uma análise sobre ele na mesma edição da Science.


O Sustentabilidade Allianz entrevistou Rangel, que defende que temos tempo para agir – mas não podemos esperar mais.


Como o “débito de extinção” foi calculado na Amazônia?
É importante frisar que o desaparecimento de espécies de um determinado lugar não ocorre imediatamente após esse lugar sofrer um impacto. Ao total de espécies já condenada ao desaparecimento por impactos do passado, dá-se o nome de débito de extinção, que na Amazônia foi calculado para centenas de regiões com 2.500 quilômetros quadrados (50 km x 50 km).

Para cada uma dessas regiões, foram usados dados de distribuição de espécies de aves, mamíferos e anfíbios para contabilizar quantas espécies naturalmente ocorriam naquela região antes de haver qualquer impacto. Depois, subtraiu-se a área da região que já foi desmatada (desde 1970 até 2010) e que, estima-se, será desmatada até 2030, 2040 e 2050. Em função dessa perda de floresta por desmatamento é possível estimar quanto do total de espécies naturais de cada região se perderia. A diferença entre o número de espécies que atualmente existe e o número de espécies esperado em função da proporção de floresta intacta é o débito de extinção.

Você propõe um "calote" no débito de extinção. Como isso se daria?
Existem diversas maneiras de evitar com que este débito (ou dívida) seja efetivamente pago, ou seja, que as espécies eventualmente venham a desaparecer da região em função de desmatamento já ocorrido. Por exemplo, pode-se investir em regeneração da floresta em áreas com débito de extinção mais grave. Regeneração da floresta costuma apresentar resultados em algumas décadas, mas por vezes é o suficiente para evitar que algumas espécies realmente desapareçam da região. Além disso, pode-se investir em medidas que favoreçam a recuperação da biota de uma área por efeito de resgate. Por exemplo, a recuperação de áreas degradadas é muito mais dinâmica se houver corredores que as liguem a áreas preservadas. Daí a importância de pensarmos não em unidades de conservação isoladas, mas em redes de unidades de conservação que se complementem.


O ritmo de devastação na Amazônia tem caído nos últimos anos. Independentemente disso, o débito de extinção acontece? Como freá-lo?
Se nenhuma nova árvore for derrubada na Amazônia, mas nada mais além disso for feito, o débito de extinção acumulado desde a década de 70 será eventualmente pago. Ou seja, espécies vão acabar desaparecendo de parte da área que anteriormente ocupavam.

Para evitar que o débito continue acumulando, é preciso seguir diminuindo o ritmo de desmatamento na Amazônia. Além disso, é preciso que haja um melhor planejamento/zoneamento da Amazônia para evitar que regiões com maior biodiversidade estejam vulneráveis à expansão da fronteira agrícola. Preservar uma região de alta biodiversidade é evitar que o débito de extinção siga em ritmo galopante.

Como a sua pesquisa pode contribuir para a preservação da Amazônia?
A indicação de regiões onde há maior risco de perda de espécies, em função de desmatamento que já aconteceu ou é iminente, serve de indicador para a tomada de decisão sobre políticas de estratégia de conservação. Quanto mais informação houver, e quanto mais bem delineada for a estratégia de conservação, mais bem alocados serão os escassos recursos para preservação que dispomos para a Amazônia.


Como o desmatamento na Amazônia é "recente", em quais casos já ultrapassamos o tempo do débito de extinção?

Até agora há muito poucos relatos de espécies que desapareceram de regiões onde anteriormente estavam presentes (extinção local). Como você bem disse, o desmatamento na Amazônia é muito recente e, portanto, esse débito ainda não começou a ser pago. A cada nova extinção local, esse débito vai sendo pago. A cada nova árvore no chão, esse débito vai aumentando. A cada nova árvore plantada, cada hectare regenerado, esse débito vai diminuindo.

Ainda estamos em tempo de reverter o quadro – ou de dar "calote"?
Difícil dizer. Em algumas áreas já ocorreram algumas extinções. Existe uma grande falta de informação a respeito de extinções, pois em geral a confirmação demanda estudo de muito longo prazo. Entretanto, o quadro geral é otimista para boa parte da Amazônia, pois ainda seria possível dar o calote na maior parte da dívida, na maior parte da Amazônia. Eventualmente parte da dívida terá de ser paga. Mais importante é evitar que ela continue aumentando...

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Fonte: Allianz Sustentabilidade, em 05/setembro/2012 - http://sustentabilidade.allianz.com.br
 

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